Autoridades
afirmam que foram instruídas a priorizar uma maior integração com os Estados
Unidos e a União Europeia
Roberto
Azevêdo, diretor da OMC: oficialmente, o governo Dilma diz que planeja avançar
tanto em negociações multilaterais na OMC quando em acordos comerciais mais
focados
Brasília
- O Brasil fez forte campanha para conseguir a chefia da Organização Mundial do
Comércio (OMC) nesta semana, mas a portas fechadas o próprio país admite que a
principal missão da entidade --avançar nas negociações globais de comércio--
parece no momento uma causa perdida.
Em
vez disso, o governo da presidente Dilma Rousseff avança, ainda que
cautelosamente, na direção de acordos bilaterais e regionais menos ambiciosos
que podem ter maior chance de sucesso.
Na
terça-feira, o diplomata brasileiro Roberto Azevêdo venceu a disputa para ser o
próximo diretor-geral da OMC, o que foi comemorado por Dilma como uma vitória
dos países em desenvolvimento.
Mas
com as negociações lideradas pela OMC no limbo há anos, várias autoridades
afirmaram à Reuters que foram instruídas a priorizar uma maior integração com
os Estados Unidos e a União Europeia.
"O
Brasil fez uma aposta pela OMC, mas agora a OMC não tem muita perspectiva de
avançar. Assim, começa a surgir a percepção de que temos que partir para
acordos bilaterais", disse uma autoridade que, como as outras, pediu
anonimato.
"O
governo começa a acordar para o fato de que o mundo está avançando e nós
estamos perdendo mercado. Não podemos ficar parados." Os mais próximos a
Dilma dizem que ela não é uma protecionista, mas tem se mostrado relutante em
explorar negociações comerciais devido a desequilíbrios econômicos ainda
remanescentes da crise global de 2008/09.
Ela
tem reclamado que países ricos estariam promovendo uma "guerra
cambial" para enfraquecer suas moedas por meio de políticas monetárias
expansionistas, favorecendo de forma injusta suas próprias exportações.
Como
resultado, Dilma elevou no ano passado os impostos sobre dezenas de produtos
importados, de carros a vidro, fechando o Brasil ainda mais.
O
comércio responde por apenas 25 % da economia brasileira, a menor proporção na
América Latina de acordo com o Fundo Monetário Internacional (FMI), atrás de
Venezuela (52 %), México (59 %) e Chile (71 %).
O
Brasil teve por muito tempo uma reputação de detonar as negociações comerciais,
ao invés de impulsioná-las. O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva foi
fundamental para enterrar os planos de pacto de comércio de todas as Américas
na última década, e também ajudou a estancar a rodada Doha de negociações
comerciais, insistindo para que Washington e Bruxelas desmantelassem seus
subsídios agrícolas.
No
entanto, o persistente crescimento fraco da economia, que cresceu apenas 0,9 %
no ano passado e está patinando em 2013, parece estar influenciando a
presidente Dilma a buscar uma maior integração, dizem observadores.
"Você
finalmente tem um governo que sabe que o país não pode ficar isolado",
disse Vera Thorstensen, chefe do Centro de Comércio Global e Investimento da
Fundação Getúlio Vargas.
Sinais
recentes
Oficialmente,
o governo Dilma diz que planeja avançar tanto em negociações multilaterais na
OMC quando em acordos comerciais mais focados.
"O
Brasil segue defendendo que a liberalização pela via multilateral", disse
o Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior em resposta por
email à Reuters. "Este esforço tem sido combinado com o empenho em
aprofundar a integração regional e estabelecer acordos com parceiros
selecionados." Ainda assim, os sinais mais encorajadores têm claramente
vindo do fronte bilateral.
Vários
diplomatas disseram ter ficado surpresos com uma reunião de executivos
norte-americanos e brasileiros neste ano, em que autoridades brasileiras
--entre elas o ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior,
Fernando Pimentel --prometeram acelerar as negociações para acordos bilaterais
de investimento e serviços com Washington.
O
que acreditava-se ser uma reunião rotineira em Brasília acabou virando um
"sopro de ar fresco" para o comércio entre os dois países, disse um
diplomata.
Também
há sinais de que líderes empresariais podem estar começando a se afastar
lentamente do protecionismo. Por exemplo, autoridades afirmaram que uma recente
consulta do governo junto a líderes empresariais mostrou amplo suporte à
aceleração das negociações com a União Europeia.
"Hoje
vivemos em um mundo em que o países estão baixando as barreiras tarifárias,
impulsionando o comércio e sendo mais competitivos. Nós estamos perdendo
competitividade",disse o diretor de desenvolvimento industrial da
Confederação Nacional da Indústria (CNI), Carlos Abijaodi.
Parte
dessa mudança pode ser explicada por acontecimentos recentes. Apesar de uma
safra recorde de soja, a balança comercial do Brasil tem se deteriorado tanto
neste ano que alguns temem que o país poderá registrar seu primeiro déficit
comercial anual em 13 anos.
O
senso de urgência também tem sido alimentado por uma série de pactos comerciais
regionais sendo trabalhados entre Estados Unidos, Europa e outros países na
Ásia e América Latina que podem deixar o Brasil de fora.
E a
capacidade do Brasil de negociar acordos comerciais também sofre a restrição
das regras do Mercosul, o bloco comercial regional que também inclui Argentina,
Uruguai, Paraguai e Venezuela.
O
Mercosul proíbe os países de assinarem unilateralmente acordos que envolvam o
comércio de bens. Entretanto, num momento de alta tensão com a Argentina, o
Brasil avalia a ideia de flexibilizar as regras para permitir que cada membro
negocie acordos comerciais a seu próprio ritmo, disseram autoridades
empresariais e do governo.
Fonte:
Exame
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